Provas e Trovas #1

Ler sobre cerveja é bom, falar sobre cerveja idem, escrever sobre cerveja também não lhes fica nada atrás, mas é a beber que nos entendemos melhor. Eu, nós e vocês, isto não quer dizer que o tenhamos de fazer em quantidades reprováveis, mas só com prova podemos avaliar o nosso trabalho.

Estes dias de brassagem nascem de conversas e ideias de explorar ingredientes inusitados, novas técnicas, desafiar o que não se deve fazer numa escala comercial. Além da experimentação, acabamos por criar uma ferramenta de fácil consulta, com todas as notas do dia de produção.

Como provar algumas destas cervejas? Falem connosco, escrevam uma mensagem, em troca de uma boa conversa temos todo o gosto em partilhar convosco o (pouco) que fazemos . Fiquem também atentos aos encontros de homebrewers espalhados pelo país, dizem que vamos aparecendo. Não demorem muito porque algumas destas desaparecem numa tarde…

Assim como a produção, a prova e um comentário final merecem ficar documentados, para referência futura. Em certos casos, podemos mais tarde revisitar e analisar a evolução de cada cerveja individual. Outras viverão somente o momento, deixam a sua memória e dão lugar à próxima.

Grisette Alfazema

Prova

São 4 cervejas a comentar, tentemos manter isto simples:


Base: Grisette competente, aromática, corpo interessante que não denuncia o sour mash. Sem expressão da cultura mista, perfil fenólico da levedura Saison.

Alfazema Flor: Difere pela nota aromática da planta que faz lembrar canela, ligeiro amargor vegetal.

Alfazema Bitter: A estrela da companhia, aroma mais pungente e complexo que muitas cervejas lupuladas. Profundidade de aromas e sabores numa dança perfeita. Tinturas, façam tinturas.

Camomila Bitter: Segundo lugar, proposta mais esotérica com a camomila e cardamomo a lutarem pela fama. Aroma intenso, talvez demais? Depende a quem perguntem mas, outra vez, façam tinturas.

Trova

Bónus para dividir o lote em 4. Deu trabalho? Bastante. Compensou? Sem dúvida.
A possibilidade de ter uma base, o controlo, e brincar com várias adições, deixou espaço para comparar a nossas opções. A técnica de brassagem não fica evidente na prova, talvez desnecessária. No lado oposto, as tinturas foram um sucesso. Revisitar o perfil de água a puxar uma cerveja mais seca, as Grisette merecem.
A base marcou, sem deslumbrar, mas deixando certezas de ser revisitada. Com outros argumentos na bagagem, há um sem fim de possibilidades e combinações.

All the Bretts + Lacto Blend: Sour com framboesa e baunilha

Prova

Aroma a compota de framboesa, ligeiro funk. No palato, uma acidez láctica assertiva, bem pronunciada e limpa. Tilinta a parte de trás do maxilar, dando rapidamente lugar à framboesa, num final à imagem de um coulis. A baunilha equilibra a acidez, carbonatação média, as papilas a salivar, pedem mais um golo.

Trova

Cerveja para repetir, maior cuidado com ingresso de oxigénio, minimizar notas de ácido acético e acetato de etilo. Maturação a frio prolongada para promover precipitação de partículas de frutas e arrastar menos depósito no embalamento. Aumentar carbonatação. Possivelmente aumentar a baunilha para lidar com a crescente acidez, dado que o lactobacillus continua vivo a fazer das suas.

Patersbier: Mel e Amores-perfeitos

Prova

Aroma floral e a citrinos. No palato, sabor a limão e laranja confundem-se com casca branca, culpa do amargor presente. Tart, não chegando a ser ácida. Carbonatação forte. Corpo leve e bastante refrescante. Pede um golo logo a seguir ao último. Excelente cerveja gastronómica.

Trova

Saiu uma cerveja que deixa memórias. Como é que os elementos trabalharam em conjunto não sabemos. A maturação em dregs de Brettanomyces e bactérias lácticas elevou uma cerveja, que na fermentação parecia mediana, para uma cerveja que marcou. Sem presença evidente de mel ou amores perfeitos, será que contribuíram para o produto final? Só fazendo novamente saberemos.

Não há foto, estava tão boa que a bebemos ainda antes de conseguir tirar uma foto de jeito…

Witbier Limões Fumados

Prova

Combate que coloca frente a frente o limão fumado, as especiarias e a dose abundante de trigo. No aroma ganham as notas fumadas, com a pimenta da Guiné e alcaravia a quererem ter algo a dizer no palato. O trigo torna-se evidente nos primeiros momentos, untuosa, doçura das especiarias a lembrar baunilha, o limão sempre em papel secundário a equilibrar o aroma e a prova, sobressaindo mais no final.

Trova

Enquanto houver grelhador, haverá alimentos a serem fumados, sejam ou não para a cerveja. Esta deve ser uma cerveja budista, morrendo para reencarnar noutra brassagem, deixando para trás o doce e abraçando mais a acidez do limão. Bónus para o cereal mash que concedeu um corpo extremamente rico numa cerveja de grau moderadamente baixo. Desconstruir cada elemento e dar-lhes um palco para brilhar.

Stout de Mirtilo e Vinho com Madeira em Armagnac

Prova

Presença reconfortante de álcool e Armagnac no aroma, chocolate e caramelo também. Sugestão de muffin de mirtilo. Na prova, palato muito suave, torrados quase inexistentes. Imenso chocolate, ésteres que sugerem banana madura e um mirtilo timído. Final de boca amadeirado, vínico e quente. Perdurando a harmonia com o chocolate. Stout à entrada, vinho à saída.

Trova

A prova terá de ser, obrigatoriamente, revisitada. Estes estilos transformam-se com o tempo, não se preocupam de serem esquecidas. Para já apresenta-se como uma cerveja sólida, perdendo corpo para a madeira, que a aproximou com um vinho. Base de imperial stout interessante para outras aventuras, onde os torrados não têm lugar. Os mirtilos são tímidos, sempre foram, e aqui não foi excepção. Repetir, talvez, com com ambas as leveduras em co-fermentação.

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