Brett Pastry Porter

Sim, leram bem. É isso mesmo. Um “Clash of the Titans“. Uma colisão de mundos que, teoricamente, não podem coexistir no mesmo espaço. Mas neste hotel há espaço para tudo o que venha por bem. Assim partimos para esta aventura, imbuídos do espírito de superação necessário para este desafio.

Hipótese: Será que é possível fazer uma cerveja com Brett, escura e ao mesmo tempo no espectro da doçaria, agora tão comum nas cervejas?

Para começar isto, rumamos a Sul. Neste Hotel existe uma ala Algarvia que nos inspira e foi exactamente isso que aconteceu para a componente pastry desta cerveja. Fomos buscar elementos tradicionais da região – o Figo seco e a Alfarroba tomam aqui a dianteira – acompanhados pelo Mel, também ele de Alfarrobeira, de produtor local, e complementados pela canela.

Para o estilo de cerveja, sai uma Porter, cerveja escura que ligará com estes elementos.

E depois, o Brett, claro.

Esta é uma cerveja cujo o desafio está no balanço dos ingredientes. Alguma coisa em demasia pode ofuscar o resto. E a interacção do Brett com maltes escuros pode criar sabores de plástico queimado. É preciso escolher uma estirpe não muito fenólica – aqui optámos pela Brett Lambicus da Wyeast – e dando continuidade à estratégia de baixar a adstringência dos grão pretos usando cereal preto sem casca.

O plano das festas é fazer a cerveja primeiro, fazendo uma fermentação primária a 100% com o Brett. Depois prepararemos um xarope / pasta com os vários ingredientes pastry, quase como se fosse uma cobertura e iremos juntá-lo à cerveja no secundário.

Comecemos então pela parte cervejeira. Uma receita de Porter começa com um malte base Inglês, um pale da Simpsons, uma selecção de crystal malts para conferir algum corpo e alinhar já com a temática pastry, Aveia para dar alguma cremosidade e mais corpo e o tal malte escuro, o Carafa Special da Weyermann, sem casca.

Brassagem de infusão simples, a 69º C, porque o Brett come muito dextrinas. Temos de ter em conta isso para a cerveja não ficar com um corpo fraquinho. Brassagem alta mais os cereais não maltados vão compensar (ou assim esperamos). pH da brassagem no lado mais alto a ficar nos 5.5 depois de uns acertos com o bicarbonato de sódio.

Lúpulo numa cerveja pastry é contra senso, por isso aqui vai apenas um bocado daquele Warrior de amargor “limpo” ao início da fervura para balancear o mosto. Acabamos com um pouco mais de densidade e líquido a menos, pelo que acertamos a coisa com um pouco de água para ficarmos com os números a bater certo e mitigar o “ocd” cá da casa.

Nada de mais truques. Neste ponto, é atar e por ao fum… ai, transferir pó fermentador e inocular com o Brett a 23º C. Deixar fermentar por 3/4 semanas.

Enquanto o Brett vai à sua vidinha e faz o trabalho esperado, vamos dar uma de pasteleiro. Após o período de fermentação é tempo de preparamos a parte pastry da cerveja. Retiramos aqui uma página das técnicas de doçaria e vamos compor um xarope com os vários elementos, como aqueles que se fazem para as sobremesas ou para cobrir os bolos.

Começamos por cortar os figos secos em rodelas pequenas, cobrimos com o mel e juntamos água filtrada. Levamos a lume brando para começar a desfazer. Quando começar a ficar em papa juntamos a farinha de alfarroba, sumo de uma lima e abençoamos com um bocadinho de alecrim e mais uns pozinhos de canela. Depois é ir misturando e envolvendo, até ficar numa pasta maleável mas consistente. É que isto precisa de ir para o fundo de outro fermentador, depois de arrefecido, para de seguida deitar a cerveja por cima.

De volta à cerveja, por esta altura, a casa inicial deste projecto já ostenta bonito véu no topo, que é como quem diz um bela película nascida para proteger o líquido do oxigénio, que quase parece a manta da avó a proteger do que vai lá fora.

Queremos ser respeitosos, por isso usamos o sifão com jeitinho para não perturbar o sono delicado da película. Sem muito espalhafato passamos a cerveja para o próximo fermentador, aquele onde já pusemos xarope pasteleiro que tornará isto numa pastry Porter.

Deixamos esta bela mistura unir-se e repousar por mais um par de meses, para toda a gente se ficar a conhecer bem. Pelo meio umas “remontages” para assegurar que todos se misturam e se encontram. E siga para a garrafa, carbonatada para uns 2.2 volumes, esperando que o repouso com o resto de Brett desenvolva ainda algo mais de carbonatação.

Será que é possível fazer uma cerveja com Brett, escura e ao mesmo tempo no espectro da doçaria? Nós achamos que sim.


Brett Pastry Porter


Batch: 20L
Total Cereal: 5,37 Kg.
Densidade Inicial: 1.054
IBU: uns poucachinhos 18
Tempo de fervura: 60 minutos

Cereal

72% – 3.87 kg. Pale
8% – 0.43 kg. Caramunich
8% – 0.43 kg. Aveia
4% – 0.21 kg. Carafa Special III
4% – 0.21 kg. Crystal Dark
4% – 0.21 kg. Crystal DRC

Lúpulo

Warrior 10 gr. (pellet) @ 60 min.

Extras

Xarope:
500 gr. figos secos
375 gr. mel alfarrobeira
100 gr. farinha alfarroba
300 gr. água filtrada
Sumo de 1 lima
Alecrim
3 paus de canela
20 gr. canela em pó

Levedura

Wyeast Labs #5526 Brettanomyces Lambicus

Água

Ca: 65
Mg: 3
Na: 36
Cl: 98
SO4: 40
SO4 to Cl Ratio: 0,4

Brassagem

Sacarificação – 60 min @ 69ºC
Mash Out – 10 min @ 76ºC

pH@30 min 5.5

Observações

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